sexta-feira, 30 de maio de 2014

Entrevista Direitos Humanos e Movimento LGBT


Amigos,aqui coloco pela primeira vez uma entrevista que realizei pela internet com o Dr. Lucas De Alencar ,de Brasília,que atua na comissão de diversidade sexual do conselho federal da oab e representa a entidade no conselho nacional de combate à discriminação e promoção dos direitos de lgbt. Também faz parte do Inesc - Instituto de Estudos Socioeconômicos, entidade da sociedade civil com atuação bastante consolidada na área de defesa e promoção direitos humanos.
1)Como está o desenvolvimento de uma legislação geral para proteger os integrantes do movimento LGBT da homofobia
De inicio, acho importante destacar que falar de homofobia, falar de violência contra lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis, envolve um sem número de agressões, ataques, omissões, que diuturnamente afetam pessoas pelo simples fato de expressarem o amor, expressarem o ser, de modo inaceitável para parcela considerável da nossa população. Vale dizer, como muitos já disseram, que não aceitam porque foram e são desde cedo ensinados a odiar, a desprezar, a rejeitar, a violentar. De natural neste ódio, nesse repúdio, nessa violência, não há nada. O Brasil carece de legislação federal para a defesa e promoção de direitos de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis (LGBT). É possível identificar algumas iniciativas do poder legislativo em Estados e Municípios voltadas ao enfrentamento da violência contra essa população, como temos aqui no Distrito Federal a Lei 2.615/2000. Mas a efetividade da proteção legal, em regra, ainda é bastante questionável e aquelas pessoas que sofrem diariamente com a homofobia, a lesbofobia e a transfobia, continuam invisíveis para parcela significativa dos políticos brasileiros. A situação do DF traduz bem essa situação. A lei acima referida, sancionada no ano 2000, até o presente momento não teve qualquer efeito concreto na proteção de direitos de LGBT, já que depende de regulamentação pelo Poder Executivo das sanções que a norma prevê para discriminação por orientação sexual e identidade de gênero e o governo permanece a mais de uma década inerte. No ano passado tivemos a absurda situação de ver publicado num dia o decreto regulamentador da Lei 2.615/2000, e a sua revogação no dia seguinte, como resposta do Executivo às pressões de grupos fundamentalistas contrários à defesa e promoção de direitos de LGBT. É possível apontar iniciativas importantes na Administração Pública, com o reconhecimento, pelo Poder Executivo da União, e de alguns Estados e Municípios, de direitos nas esferas previdenciária, trabalhista, estatutária e educacional. Contudo, no que se refere a avanços significativos na defesa e promoção de direitos de LGBT, merece destaque a ação da Justiça brasileira. A atuação da Advocacia, da Defensoria Pública, do Ministério Público provoca Poder Judiciário já há duas décadas, e como resultados dessa ação temos importantes precedentes judiciais firmados para a proteção e promoção de direitos frequentemente negados à população LGBT pela falta de expressa previsão legal. Ponto maior dessa disputa se revelou por ocasião do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ADI4277 e da ADPF132, que resultou no reconhecimento da união estável formada por pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. A Ordem dos Advogados do Brasil, através de sua Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal e das várias comissões das seccionais e subseções, desenvolve uma iniciativa muito audaciosa nessa área, que é a tentativa de propor, por iniciativa popular, o Estatuto da Diversidade Sexual. O projeto do Estatuto, um trabalho iniciado em 2011 contando com a colaboração de diversos juristas, propõe a modificação de aproximadamente 100 dispositivos da legislação federal, incluindo, i.e, normas do Código Civil, da Lei de Registros Públicos, do Código Penal, e tem como objetivo promover no Brasil um marco legal que assegure a igualdade em dignidade e direitos aos que amam um amor que não deveria ousar dizer o nome, ou que se identificam e se expressam fora dos limites firmados pela heteronormatividade. Para conhecer mais sobre o projeto do Estatuto da Diversidade Sexual e apoiar a iniciativa, basta acessar o portal http://www.estatutodiversidadesexual.com.br/
2)Neste contexto como está a questão da sua criminalização?
A discussão sobre a criminalização da homofobia, muito centralizada na tramitação do PLC122/2006, foi interrompida, na prática, por iniciativa do Senado Federal. Todas as referências a “identidade de gênero” e “orientação sexual” foram removidas do projeto de reforma do Código, com o fundamento de que existe certa indefinição sobre o significado dessas expressões e que é necessário amadurecer o debate público sobre essa temática. Na realidade, a justificativa do senador Magno Malta é fruto de uma teoria crescente nos meios religiosos aqui no Brasil que enxerga na luta para promover e proteger os direitos de LGBT um reflexo de uma “ideologia de gênero”. Nós, que lutamos para promover e defender direitos, segundo essa teoria, fazemos parte de um “engenhoso plano tático de infiltração ideológica”(?), para negar a “anormalidade do homossexualismo” e impedir uma “discriminação justa”. Somos “gayzistas”. Agora é lutar para reinserir a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero no debate sobre a reforma do Código Penal, conscientes de que enfrentaremos novamente o “raciocínio” acima. De fim, destaco que reconheço que o sistema de justiça criminal brasileiro é extremamente falho. A população não confia na polícia. A polícia não tem estrutura para apurar os crimes adequadamente. Sem uma apuração o Ministério Público nada pode fazer. E o Judiciário não pode punir quem quer que seja sem o devido processo legal. Mas essa falência da justiça criminal no Brasil não retira o caráter simbólico importante que a criminalização da discriminação por orientação sexual e identidade de gênero teria. Precisamos criminalizar não com o objetivo primeiro de encarcerar pessoas ensinadas a odiar, ensinadas a rejeitar, mas para retirar qualquer sombra de dúvida de que é um objetivo fundamental da nossa República promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
3)No contexto de direitos humanos qual o papel que este movimento tem na sua efetivação,ou seja,na efetivação dos direitos humanos em geral?
A luta pela cidadania LGBT, no contexto geral das lutas por direitos humanos, representa, por seus movimentos e organizações com atuação nacional, regional e internacional, um reforço significativo a um projeto de globalização contra-hegemônica, que não se confunde com o universalismo estéril de declarações, mas que se pauta pela luta diária para conquistar e defender a dignidade das pessoas que são discriminadas em razão da orientação sexual e da identidade de gênero. Não se luta para reproduzir aqui ou onde quer que seja um estilo de vida marcadamente norteamericano e europeu, não se pretende impor ditadura de minoria alguma ou ainda expandir a influência do ocidente sobre outros cantos do planeta, como dizem alguns contrários a nossas ações. Nossa luta deve ser em busca de horizontes iguais, respeitadas todas as nossas diferenças, religiosas, étnicas, culturais, sabendo a hora de confrontar e a hora de ouvir, a hora de apartar e a hora de unir.
4)Na minha opinião o movimento LGBT é importantíssimo na Humanidade porque radicaliza uma opção afetiva absolutamente ligada à necessidade de felicidade.Contudo,como todo o movimento no seu início ele tem uma enorme capacidade crítica mas ao mesmo tempo precisa do poder e das condições econômicas para prosperar e por isso ainda confunde um pouco a felicidade com o poder,critica-o mas depende dele,vive muito mais preocupado com ele.Concorda comigo?Dê a sua opinião.
Não só o movimento por direitos LGBT sobre com essa contradição entre a crítica necessária a um Estado que não corresponde às expectativas do contrato social e a necessidade de ingressar nas suas instituições para promover mudanças que favoreçam a abertura de espaços para expandir e consolidar lutas por direitos. Ainda sem compreender as importantes mudanças pelas quais passa nossa sociedade, com o enfraquecimento seletivo do Estado providência, com a imposição de um Estado mínimo em benefício de um amplo e quase ilimitado poder de poucos grandes grupos empresarias, e com a falência dos projetos socialistas de transformação social, os movimentos e organizações progressistas se veem agora numa posição de ter que defender um nível mínimo de direitos, assumindo uma postura conservadora frente às expectativas de significativo retrocesso social. Acho que os movimentos sociais progressistas, em geral, estão passando por uma fase de adaptação a essa nova característica da luta por direitos humanos, que passa a exigir por vezes a defesa do status quo para impedir retrocessos, noutras tantas necessita da postura revolucionária, de quem sabe que não poderá contar com a complacência dos seus opressores para ver seus direitos reconhecidos e respeitados.
5)Eu sou professor e já dei aula sobre direitos humanos.A minha preocupação é o ensino de direitos humanos no ensino básico a dificuladde reside que lutar por este ensino é desafiar o mundo adulto que não segue estes direitos.É quase como modificar a humanidade como um todo.Qual é o seu pensamento sobre este ensino?
Ensinar a respeitar, a conviver, a amar, já é difícil quando tratamos do que é desconhecido. Quando este ensino envolve o que, além de desconhecido, provoca talvez os preconceitos mais violentos e cruéis da nossa população, certamente a dificuldade é ainda maior. E a questão é: não tem como enfrentarmos a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero sem passar pela educação, o que inclui a educação formal, e mais especificamente, a educação básica. Educação em e para os direitos humanos é um direito de todas as pessoas e um dever do Estado brasileiro, incluindo todas as esferas da administração pública. Cabe à União, aos Estados e Municípios brasileiros implantar as estruturas mínimas para a participação da sociedade civil na concepção e execução das políticas públicas de promoção e proteção de direitos de LGBT. Isso inclui, evidentemente, educar a sociedade para reconhecer as diferenças e impedir que delas resultem desigualdades, injustiças. Lucas de Alencar Oliveira Advogado Sócio da Hathaway, Alencar & Fischer Advocacia Integrante da Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil Membro do Inesc - Instituto de Estudos Socioeconômicos Gostaram?mandem opinião,comentários para este blog.

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