Vendo um
documentário sobre as charges feitas por um jornal Dinamarquês ,que geraram
as primeiras reações do Islã contra o Ocidente,me levam a aprofundar o tema,reformulando
algumas concepções que demonstrei na época do atentado ao Charlie Hebdo,não no
sentido de defendê-lo,mas de compreender que certas imagens realmente podem
ofender uma pessoa de forma ilegítima.
Em primeiro
lugar vi neste documentário uma afirmação de
que embora o Corão não proíba a realização de imagens do rosto do
profeta a tradição o impede , para
permitir que os jovens tenham esta
imagem na sua imaginação.
Esta imaginação,assim
como o pecado do pensamento dos cristãos,pode
ser controlada,inclusive no seu aspecto crítico?Quero dizer um menino
muçulmano que imagina o rosto do profeta não poderá aduzir a ela um comentário jocoso ou um princípio de
crítica quanto aos seus eventuais erros de condução da religião?Pode-se confiar em que todos serão dogmatizados por
esta proibição de imagens?Evidentemente que não.
Quando um
menino cristão pensa na Virgem Maria ele não vai se excitar eventualmente?
Dostoievski
,no maior romance já escrito ,“Os irmãos Karamazovi”,culpa um dos personagens
principais,Dimitri,de assassinar o seu
pai,mesmo que não tenha sido ele,pelo critério do pecado de pensamento.Não foi
ele quem matou,mas deve ir para a Sibéria,mesmo por erro judiciário,porque o
pecado do pensamento é mais importante.É claro que este tipo de conceito gera a possibilidade de violação criminosa
da intimidade humana.
É aquela
história:quando Daniela Perez foi assassinada um monte de piadas grosseiras rolaram
pela internet e a mãe,Gloria Perez, poderia afirmar que o sofrimento dela não era levado
em consideração pela democracia e esta
atitude ,se não contraditada por quem é ofendido pode se reproduzir numa escala infinita e gerar e
reproduzir um comportamento coletivo e não raro estatal totalitário,que aliás
esta é a origem do fenômeno.
Em primeiro
lugar nada disso justifica o crime em qualquer circunstância,como
reação.Contudo é preciso entender que numa época em que a imagem ainda é mais
importante do que o pensamento que se expressa em palavras(um analfabetismo
funcional mundial),o seu uso provoca estas injustiças.
A imagem do
Profeta como uma bomba sugere sim que todo muçulmano é terrorista,o que não é
verdade e portanto,ainda que a intenção do chargista não tenha sido esta,ela
ocupa um papel político desastroso,o qual deve ser repudiado,como opinião e não
como censura.
A reação dos
muçulmanos ao queimar a bandeira dinamarquesa parece sugerir que há um uso político do outro lado também,que
concordaria com a insinuação da imagem.
Nós vivemos num
mundo em que cada vez mais o
pensamento,a análise, é substituída pela
manipulação de frases feitas que conduzem massas inteiras para caminhos não
escolhidos.
Não adiantou
nada criticar os regimes totalitários,a manipulação do mass media,porque a democracia ficou refém deste
mercado de ilusões que serve aos propósitos
do lucro e dos interesses políticos atinentes.
Nós vemos em
eleições no Brasil candidatos evangélicos colocarem em adesivos:” Não precisa
discutir,basta me seguir” ou “ Quem não vive para servir não serve para viver”,revelando
um princípio de morte para quem diverge.
Assim sendo
nós temos que repensar os critérios da democracia diante deste quadro,não no
sentido da censura,repito,mas no da consciência dos cidadãos de não violar a
intimidade,de ter cuidado quanto aos discursos,aos conceitos emitidos em
relação aos outros.
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