quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Dr. Ivo Pitanguy e João Havelange



Eu ia fazer o necrológio apenas do doutor Ivo Pitanguy,mas com o passamento  de João Havelange eu resolvi ampliar este artigo para o encômio de algumas qualidades que eu acho essenciais nas pessoas,apesar dos seus defeitos.
Eu vou dividir estas pessoas em dois grupos:Dr. Ivo Pitanguy,Flavio Rangel  e Isaac Karabtchevski ,este último ainda entre nós e o outro grupo se constitui só de João Havelange,porque são dois temas diferentes:política e processo educacional.
Comecemos pela política:
João Havelange,como qualquer político, é uma figura controversa,mas para mim o seu saldo é positivo.Sei que muitos da esquerda vão achar isto um despautério,mas eu entendo que João Havelange representou o progresso possível e inevitável do futebol mundial.
É lógico,que juntamente com os meus amigos da esquerda,eu queria uma internacionalização do futebol que preservasse a arte em primeiro lugar,depois do dinheiro e as características nacionais em detrimento da imposição deste modelo europeu que está aí e que o acusam de criar,exagerando sua culpa.
Só teria sido possível  garantir,pelo menos para o futebol brasileiro esta proteção, se o nosso futebol,internamente administrado não se interessasse só pelo dinheiro e  não tivesse(não sendo culpa dos péssimos dirigentes brasileiros)perdido a fábrica de jogadores,quando iniciou-se o período de especulação imobiliária,que acabou ,entre outros,com os campos de várzea.
Isto tudo não é culpa do Havelange.É um processo que vem se desenvolvendo à revelia dele e cá entre nós culpá-lo de europeizar o futebol é dose,porque Havelange nunca recebeu votos e apoio da Europa ocidental,inclusive universalizando o futebol(inevitável tendência histórica)favorecendo povos do terceiro mundo.Para isso cometeu exageros de colocar árbitros despreparados na copa de 90 na Itália principalmente em que um deles marcou impedimento de lateral.Mas eram árbitros das ilhas Fiji,Taiti,Arábia,Burkina faso ...que votavam nele.
Caberia a nós críticos lutar pela preservação nacional das fábricas de jogadores,porque aí nós teríamos condição de defender este produto,em nome do país e com grandes jogadores era possível  arrecadar mais pelos clubes brasileiros,os grandes produtores e preparadores destes jogadores.
Que havia tráfico de influência na FIFA isto é inevitável na política também.Não defendo nem banalizo esta responsabilidade,bem como as acusações últimas de corrupção,mas uma coisa é acusação outra prova.
O segundo grupo
No caso de Ivo Pitanguy,Flavio Rangel e Isaac Karabtchevski o que ressalto é  arte de expor,de ensinar,no seu verdadeiro e único sentido que é o de expor os fundamentos das coisas sem vulgarizá-los.
Hoje,com a  perniciosa influência de mestrados e doutorados ensinar é jogar catadupas de textos estrangeiros sobre os alunos,inclusive dos primeiros períodos das faculdades ,e  mandá-los ler para depois discutir em conjunto,mas para mim será sempre assim:professor tem que dar aula,tem que expor,tem que dissertar falando,mesmo que depois discuta com os alunos.
Eu não sei se já me referi aqui a Flavio Rangel.Uma vez eu comprei numa banca de jornal o primeiro volume da coleção “ Teatro Vivo”dedicado a Sófocles e  Édipo-Rei, da antiga Abril Cultural e lá no fundo,num posfácio ,havia um titulo assim “ Édipo-Rei um espelho de muitas imagens”,que me chamou logo a atenção e eu fiz como a maioria dos brasileiros quando compra um jornal:comecei de trás pra frente a leitura(no caso do jornal ,da página esportiva),do lugar que eu mais gostei.
Em duas folhas Flavio Rangel expôs o significado histórico e a estrutura do texto ,que me passou a ser inteiramente compreensível até hoje,bem como o posfácio,um modelo de exposição tranqüilo que uso até hoje também.
Nele Flavio expunha as camadas significativas do texto que deveriam  ser atentadas pelo leitor,notadamente jovem e  neófito como eu(era).
Depois ,ao longo da vida,venho assistindo  documentários das atuações como diretor de Flavio Rangel e o mesmo maravilhamento se dá,inclusive mostrando que lecionar não é só na sala de aula,mas nos ensaios teatrais e na vida.Uma pessoa que expõe com tanta facilidade um fundamento, que não é preciso gritar,ninguém se stressa e mais coisas belas deste tipo.
O doutor Ivo Pitanguy era  a mesma coisa.Cheguei a tentar entrar num congresso no Rio de Janeiro de cirurgia plástica para ver a capacidade expositiva do cirurgião,mas era muito (justamente)caro e fiquei com os documentários em que ele demonstrava além do mais ter uma vocação filosófica que não desenvolveu,porque sempre relacionava a necessidade de cirurgia plástica com a questão ética e estética,bem como psicológica à pessoa que ia ao seu consultório.Eu vou tratar disto mais proximamente.
E finalmente o nosso Maestro,que hoje reorganiza as partituras  de Heitor Villa-Lobos,revelou sempre a mesma capacidade expositiva.Lembro-me que no programa de Alberto Dines “ Observatório da Imprensa” comemorativo do lançamento das “ Bacchianas Brasileiras”,ao perguntar o jornalista sobre a essencial virtude de todo critico musical,aprendi com o maestro que o verdadeiro critico é aquele que é “capaz de ler uma partitura como se lesse um livro” e eu ,sacrílego,extendo este conceito para outras atividades.
Um bom critico de cinema,de pintura,de escultura,tem que ter esta virtude.
Todas as vezes em que me atrapalhava ou me atrapalho no meu processo expositivo eu ia (e vou)nestes documentários para readquirir fluência e recontatar psicologicamente  a verdadeira arte de ensinar e expor.

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