domingo, 20 de dezembro de 2020

Os comunistas e a eternidade

 

O neófito de comunismo como eu fui um dia ,aprende este pensamento a partir da crítica à ideologia capitalista que defende a sua eternidade.Criticar o comunismo é,ipso facto,defender a eternidade do capitalismo.

Desde Adam Smith até Fukuyama há uma ideologia justificadora da permanência eterna do capitalismo.Todos os regimes e movimentos na História,de um jeito ou de outro,procuraram este eternidade.

Mas como um ser finito no tempo como o ser humano pode pretender ter acesso a esta eternidade?E quando eu faço críticas ao socialismo real aqui os radicais me rebatem afirmando que eu defendo esta eternidade,diante da minha constatação de que o socialismo real caiu e acabou.

Mas eu respondo como Lester Turow,guru de Clinton:se levarmos em conta que se pode defender a legitimidade e continuidade de um regime pelo tempo de sua permanência nós teríamos que propor a volta do feudalismo,que durou 1000 anos ou ,como faz a ultra direita americana,a escravidão,que durou 6500 anos.

Quem tem mais direito de propor a eternidade em torno de si do que a religão?O marxismo que durou 150 anos?Ou a Suécia que tem 600 anos?A religião acompanha a humanidade desde que ela existe.

A discussão não é o do tempo em que uma proposta fica ,se sustém.É o que dá vazão e expressão aos desejos mais gerais da humanidade como um todo.

O comunismo,que não é criação de Marx sozinho,quer que todos tenham tempo livre,como o capitalista tem;quer que todos tenham acesso aos bens produzidos por todos a qualquer momento,mas conseguir estas coisas não é fácil,não é possível por um ato de vontade,como quis Lênin.Há uma exigência de pré-condições subjetivas e objetivas para se chegar lá.

Num certo sentido,como eu já tenho dito,admito que as formas transicionais capitalismo/socialismo podem ser definitivas ,mas quem sou eu ou você leitor,para dizer que isto é eterno?Os países transicionais ,como os nórdicos,Austrália,Canadá,não são transicionais necessariamente para o comunismo ou outro regime.O são na medida em que se inter-relacionam,em que o melhor de cada um é preservado,mas fundamentalmente porque uma verdade foi estabelecida pelo esforço do socialismo,da esquerda em geral:o capitalismo e o mercado têm que ser controlados sim.

A forma e os fundamentos de como fazer isto definem o nosso tempo e o que se pode fazer nos dias de hoje.

Não estou dizendo que a social-democracia é o fim de tudo,que é a eternidade.Estou dizendo que é o possível a fazer,reunindo a liberdade com as carências sociais.E a social-democracia que conhecemos,também se esgotou,também deve se renovar.É uma exigência normal da vida o renovar-se e a esquerda é a que mais resiste a isto na História.

O problema é que a partir de Marx e da Revolução Russa se não houver a inter-relação dialética entre a matança e supressão da burguesia e a construção da utopia é traição,fascismo,etc...

Olhando a História,como eu já disse em outro artigo,quanto tempo levou a burguesia para suplantar a aristocracia?Quase mil anos.E nem sempre ela o fez de modo violento:a invenção da monarquia constitucional foi uma forma de diluir progressivamente a aristocracia aburguesando-a,como mostra Tomaso de Lampedusa em “O Leopardo”.

Os processos violentos atrasam a história,porque criam resssentimentos,destróem estruturas que poderiam permanecer e ajudar na construção do futuro.

Os processos revolucionários que não têm propostas baseadas num presente bem conhecido,que não são atualizados,se voltam para o passado ou se impõem pela força.

Mas se estiverem bem fundamentados diluem o antigo regime com calma,como foi em 1640,na primeira revolução inglesa e na revolução gloriosa de 1688.Nunca houve uma revolução tão pacifica como esta última.

Os regimes transicionais como os que eu citei acima,identificados com nações quase milenares,tém uma forte potencialidade de eternidade,como estas nações,mas ninguém sabe o que vai acontecer no momento seguinte, no futuro e quanto ao comunismo, são estes países,unidos a outros,que têm mais condição de enveredar por ele,se quiserem ,não obrigatoriamente.

Há muitos anos li a auto-biografia de Raymond Aron,o sociólogo francês,o “ Espectador Participante” ,quem,no final,concede uma entrevista a dois jornalistas radicais.Lá pelas tantas um destes jornalistas lhe pergunta como ele vê o mundo numa perspectiva de 100 anos ao que ele enfarado responde:” Como vou saber?”.

A mania de dialética,de que a dialética é o movimento geral de tudo,criou este delirio profético de que é possível fazer previsões sociais como a ciência natural faz para os fenômenos que estuda,mas são duas áreas diferentes.

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