sábado, 11 de dezembro de 2021

Marighella IV

 

Culto à personalidade

A razão principal porque a esquerda atual usa a figura de Marighella é por fazer a maior autocrítica que uma pessoa(principalmente um comunista) “pode” fazer em relação ao stalinismo e seu culto à personalidade:chorou no meio-fio sentindo-se enganado.Foi melhor do que relativizar o problema ,como muitos fizeram,jogando a culpa só na figura politica e individual de Stalin.

Contudo,assim como Lukacs houvera prevenido a todos de que o Stalinismo não era só Stalin(senão não seria stalinismo),mas um conjunto de práticas e uma psicologia,o puro e simples choro de criança não basta para “ desestalinizar” uma pessoa,que agiu sob as ordens do “titio” com tanto afinco e fanatismo.

Apresentar uma interpretação laudatória do personagem em questão,Marighella,não Stalin, é legitimo até ao ponto em que o lado dele deve ser conhecido,bem como o seu papel histórico.

No entanto,e como parte da democracia,analisar os fundamentos de sua atuação e sua atuação sem levar em conta o erro que ele cometeu,sem ver as suas opções confrontadas com as de outros ,é personalismo,culto à personalidade.

As suas características pessoais passaram ilesas ao crivo crítico e axiológico da história do comunismo brasileiro:ele não é uma figura um tanto quanto imposta ao PCB como Prestes,nem um autoritário sádico,como Arruda(nas palavras de Jacob Gorender),muito pelo contrário.Veio da Bahia,um estado que rompeu certas barreiras dogmáticas do stalinismo incorporando a religião e a diversidade da cultura.

Mas não diluiu todos os aspectos ruins do cânon vindo da urss:não a precedência do povo(trabalhador),mas a conexão entre uma personalidade forte e este mesmo povo,não exatamente preparado;não ao fundamento teórico e sim a uma atividade prática voluntarista,que entende erradamente que a tomada do estado é suficiente para fazer o paraíso(ainda mais no estado ocidental);supostamente diluindo a vanguarda,mas criando outra mais perigosa e autoritária ,militar.

Neste artigo trato do personalismo que liga uma personalidade à retaguarda,o povo,e é uma base para um processo politico de mudança.Mas em qualquer processo há algo mais do que uma trilha de centelha emocional,uma confiança(fé),a ser trabalhada.E não é algo da noite para o dia.

E no pensamento marxista a condição teórica dos militantes é algo essencial.Marighella esperava o apoio próximo do povo(outro erro),mas sabia que tinha que ser por outra mediação a sua adesão.Então ,construindo esta vanguarda (embora dizendo que não)entendeu que certos setores estudantis(crianças)tinham este perfil teórico.

Aí começa um dos problemas:o revolucionário leninista segundo o que vem da urss é alguém preparado.Mesmo que com suas teorias Marighella tenha tentado se desligar disto aí,a sua formação o conecta e o obriga a entender esta preparação.

Além do mais, a relação da figura do lider com a retaguarda,no movimento social de massas,implica pelo menos num conhecimento prévio comum.Contudo em qualquer época ou lugar as circunstâncias politicas do real se impõem às balizas.O movimento,como o próprio Marighella queria,se impõe,mas sem este background perde todo o sentido.É um movimento natimorto.

Um outro aspecto quero ressaltar,embora não pretenda desenvolver agora:este tipo de problema que é muito comum em todos os lugares, adquire um aspecto dramático no marxismo por causa do nexo teoria/prática.Juntando o aspecto teórico com a fé do movimento criada pelo nexo liderança/povo e vendo no final como as coisas andam,favorecendo esta última dicotomia geralmente os aspectos emocionais e pessoais se sobrepõem aos critérios de conduta na politica.O monismo marxista ajuda nesta identificação que favorece à pessoalidade e destrói na prática as bases conceituais conduzindo sempre à derrota.

Neste sentido é que me refiro aqui ao culto à personalidade.No fundo esta decisão de Marighella é,contra ele,um fato tipico do culto à personalidade.À parte aqueles que vêem a sua luta final como politicamente corrreta e tendo em vista de que nada adiantou,as afirmações dos remanescentes de que pelo menos algumas pessoas se levantaram contra a ditadura ,não procede,antes confirma este personalismo stalinista do herói que chorou uma vez e confirma a linha do antigo pcb:Marighella se colocou como um espantalho para a direita,que aterrorizou o empresariado paulista e justificou a operação bandeirantes,um esquema de repressão e de obtenção de dinheiro.E prolongou a ditadura.


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