Muita gente não entendeu o que
eu disse sobre os critérios do meu sitio e eu me sinto relativamente na
necessidade de explicar.
Embora tenha dito que não sou
mais comunista também não quis dizer que me tornei anticomunista.
O comunismo surgiu no século
XVIII.Na França já existiam pequenos grupos,chamados na época de seitas,porque
clandestinas.Existem autores que relacionam o comunismo da Europa com o
progresso do jesuitismo no Paraguai e aqui nos sete Povos das Missões.Existe um
autor, Pierre Hugon ,em " A Utopia Guarani",que faz esta
aproximação.Também o filme " A Missão" com Jeremy Irons e Robert De
Niro,faz referência a este momento histórico em que se gesta a utopia.
Se observarmos bem,os guaranis
da fronteira,lá mostrados no filme,têm uma vida tranquila,de produção
comunitária,que podia ser aumentada à estratosfera se eles tivessem uma
tecnologia e com um depósito comum de toda a tribo esta poderia diminuir o
tempo de trabalho e obter tempo livre.
O que os iluministas
alemães,neste mesmo século XVIII,perceberam,especialmente Lessing,um grande
escritor e filósofo,diante da revolução industrial na Inglaterra,é que o homem
moderno tinha condições de produzir bens infinitamente.A indústria mostrava que
esta posbilidade do passado era uma realidade factível.
A frase famosa,atribuída a Marx
" De cada um segundo a sua capacidade,a cada um segundo a sua
necessidade",é ,na verdade,de Lessing.Marx aderiu ao comunismo,perto de
1847 e escreveu na " Ideologia Alemã"aquilo que ele pensava deste
comunismo.Há passagens famosas em que ele se refere ao tempo livre.Ele diz que
com o tempo livre " o homem será capaz de ser amante de noite ,pescador à
tarde e cientista de manhã",porque terá bens ,à farta,que garantam a sua
ociosidade criativa.Quem pensa que o ócio criativo é uma invenção de Domenico
de Masi está enganado :Marx interpretou um conceito implícito no Renascimento e
no Iluminismo alemão e porque não dizer do "otium cum dignitate" ,do
mundo antigo que nós repudiamos porque só valia para os homens livres.Nós
queremos ócio criativo para todos.
É importante frisar que para
Marx o comunismo não era o igualar desiguais,mas,reconhecendo justeza no
pensamento de Locke,reconhecer a desigualdade natural dos homens
,apenas,evitando as desigualdades econômicas por uma sociedade produtiva e
solidária,que,sem escassez,poderia conviver com esta desigualdade sem o horror
da miséria para a maioria,como acontece no capitalismo.O capitalismo exacerba
esta desigualdade natural no afã selvagem do lucro.A superabundância de bens
evita esta " má desigualdade" se podemos usar este termo.
O reconhecimento por Marx,da desigualdade
natural dos homens,está demonstrado no texto " Crítica ao Programa de
Gotha",de 1875,em que ele faz críticas aos conceitos estabelecidos por um
congresso do partido social-democrata(ao qual ele pertencia),quanto ao problema
da desigualdade.Os social-democratas,querendo se desvincular dos liberais
acabaram por passar por cima deste fato evidente.Quando eu digo que Hannah
Arendt está certa ao vincular Marx à tradição liberal,em seu famoso livro
" A Condição Humana",todos reclamam ,mas é só lê-los.A " Crítica
ao programa de Gotha" pode ser encontrada em português no meu blog,no link
Internet Marxists Archive.
Assim sendo ,não penso ser
impossível constituir o comunismo,só não acho que estão dadas as condições
históricas,subjetivas e objetivas,postas por Marx ou numa perspectiva de curto prazo.Estas
condições são uma classe trabalhadora universalmente organizada e preparada ,na
luta, para fazer uma revolução comunista da maioria,contra uma minoria
exploradora.
Notem que eu não usei o termo
" classe operária",que Marx usava,porque esta não existe mais,como
diz Jaques Ellul em seu livro " Adeus ao proletariado".Notem que eu
nem toquei no problema da ditadura do proletariado,por isso e porque a
sociedade moderna em que predominam trabalhadores de diversos tipos,não admite
nem a ditadura da maioria sobre a minoria,se é que esta ditadura ,hoje,é
possível ou mesmo necessária.Marx não é um Deus,não é dois ,nem um dogma.Ele é
um teórico,o marxismo é uma teoria,um ativismo em torno desta teoria e um grupo
de pesquisadores e investigadores sociais.
Além do mais fica claro do que
sabemos da atividade de Marx e Engels e dos comunistas,no século XIX,que a
visão deles era irremediávelmente eurocêntrica.Vê-se isto na atitude que Marx
teve sempre com a América Latina(o artigo de Marx sobre Bolívar o
revela),frequentemente oscilando entre não dar importância e espezinhar.Dizem
que,no século XIX,um grupo pessoas no Brasil queria se aliar aos comunistas da
Europa e enviando uma carta para Engels,neste sentido,ele teria respondido:” o
barulho que este grupos fazem nestes lugares é inversamente proporcional à sua
importância”.
Como fazer uma revolução mundial
com países tão díspares,como Estados Unidos ,Brasil e China?Nesta pergunta está
colocada a minha postura diante da questão do comunismo.Buscar uma revolução
deste tipo agora pode significar deixar de lado a criação das condições
históricas supracitadas.Antes de qualquer coisa nós precisamos homogeneizar os
países e depois pensar em algo drástico.
A experiência fracassada do
leninismo nos ajuda a compreender o que eu digo.A falta das condições
subjetivas e objetivas levou o socialismo soviético ao totalitarismo,mais
afeito ao antigo regime do que ao comunismo.Quem tinha razão eram os
mencheviques.Os bolcheviques precipitaram as coisas.
Também nos ajuda ,analisar
outros conceitos discutíveis na época de Marx.Não é verdade que o motor da
história seja somente a luta de classes e a violência,que no dizer de
Engels,era a " parteira da História",frase que lemos no "
Anti-During".Existem exemplos de cooperação entre as classes,que movimenta
igualmente,para a frente,a História.Foi asim na lei das Doze Tábua,na Antiga
Roma;nas relações entre plebeus e aristocratas na Inglaterra e existem muitos
outros exemplos.Um radical me dirá:" mais isso não levou à utopia".Eu
respondo:mas criou ,igualmente, condições para tanto.
Para Marx,só o comunismo
evitaria,que,no processo de competição selvagem,em que os trabalhadores são
usados e excluídos,os bens seriam produzidos com o objetivo mesquinho do lucro
do capitalista e do seu sistema,que ficaria no nível da escassez.Se a
humanidade ultrapassasse este sistema,o objetivo seria só o trabalho e o
acúmulo de bens seria infinito em favor de todos.
Contudo,repito,fazer isto numa
sociedade muito mais complexa do que a do século XIX é algo irreal.
É possível desenvolver a
sociedade capitalista ,num sentido social,mesmo mantendo as classes,eliminando a
pobreza e deixar aos pósteros a tarefa de implantar o comunismo,para superar a
desigualdade que resta e fazer a superabundância,quiçá,sem violência.A
violência,sem estas precondições,atinge ao povo pobre e eu ,como militante e como pobre,tenho como cláusula pétrea,não
fazer nada que possa,o mais minimamente,produzir isto aí.
Tenho,também,muita dúvida,se do
ponto de vista da pluralidade psicológica do ser humano,um regime assim,com uma
natureza universal,possa agradar a todos.
Eu penso que a solução chinesa,de
dois regimes, pode,no futuro,ser construída,para garantir a pluralidade das
escolhas humanas.Não sei.
Ficou clara a minha
posição?Claro que eu voltarei ao tema.
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