Diante das reações de incompreensão em relação a meu artigo
anterior,devo esclarecer algumas coisas(como sempre):
É lógico que Guevara e Bolsonaro são em muitos aspectos
diferentes:em termos sociais,históricos,politicos e em termos
pessoais,psicológicos e de valores.Mas para o que interessa aos
povos a repressão às ciências sociais(bem como a outras)tem o
mesmo efeito e o mesmo fundamento de reprimir anti-democráticamente
o cidadão e a criatividade humana ,que é uma exigência de
progresso técnico e cultural.
Todos os regimes ditatoriais,autoritários e totalitários,de direita
ou de esquerda,o fazem,não têm por onde escapar.
Um dos pontos nodais da relação entre a questão social e a
democracia é a liberdade de pensamento,a liberdade para procurar o
conhecimento e ser criativo.Como eu disse no artigo anterior
Guevara,na revolução cubana,suprimiu as ciências sociais,como
supostamente “ inúteis” ou não prioritárias(eufemismo).Anos
depois faltou gente capaz de fazer a História da Revolução
Cubana,conforme a exigência de Fidel e quando este último sentiu um
crescimento da contestação e da violência no país,permitiu uma
certa liberdade para escrever ,que tem reflexos até hoje,com uma
literatura pujante e reconhecida no Ocidente(por interesse?).
A tese da direita,há muito consolidada,e representada pelo governo
Bolsonaro, é que o setor universitário não pode ser gratuito.Esta
visão foi sempre posta em destaque desde o primeiro governo
Brizola:privilegiar a base e estabelecer relações da Universidade
com o setor privado.No governo FHC esta tendência se manifestou
quando Pedro Malan fechou a bica dos investimentos,de modo a forçar
a área a fazer esta conexão.Naquele tempo a resistência da
universidade valeu para evitar,mas esta direita que aí entrou tem um
programa mais multifacetado,que não esconde o princípio mais que
discutível de que o universitário e sua família têm condições
de pagar pelo curso.
Há muitos anos atrás eu já me referi a estas questões:esta
afirmação supra assinalada não é verdadeira.Só a classe média
alta tem condições para pagar os seus cursos e ela já tem as suas
escolas.O resto do povo brasileiro não tem estas condições e a
privatização da Universidade não é admissível.
Por outro lado eu dissera que a autonomia universitária é
problemática porque criava e cria uma corporação exclusivista e
dissociada de um projeto e uma responsabilidade nacionais.
A propalada autonomia universitária cria grupos fechados sem ligação
com a comunidade e quando não é assim o fracionamento é imenso
,como ocorre na UERJ.Ou seja os interesses politicos se sobrepõem
aos objetivos de produção intelectual.
Esclarecendo o que eu disse no artigo anterior o intelectual
brasileiro é ibérico.Ele é diferente do intelectual estadunidense
ou dos países anglo-saxônicos e nórdicos,que pratica esportes e
tem uma vida real,não de gabinete.Eu reitero isto aí e acuso esta
postura de não ter permitido o Brasil de construir um modelo
olimpico.
Contudo o modelo do Brasil é como o dos EUA,com a Universidade
Pública.Podem existir ,como no norte,universidades particulares para
a classe alta,mas a maioria do povo precisa da escola pública e
outros mecanismos de ganhos econômicos,diferentes da dependência do
Estado devem ser encontrados(falarei sobre isto em outro artigo),mas
eu repudio a pura e simples privatização,que seria algo
absolutamente catastrófico e que,como eu demonstro sempre,contraria
a experiência de países capitalistas tradicionais,que têm uma
politica pública coerente.
Só pensamento puro constrói sentido,história,mas eu não me refiro
só à filosofia,mas à erudição.Erudição quer dizer
interdisciplinaridade,conhecimento de línguas,arte e no seu âmbito
estas disciplinas sociais.Na erudição até o conhecimento de
ciências naturais é bom.
O mundo muda:não há como exigir de ninguém que estude
obrigatoriamente Latim ou Grego,mas não se pode eliminar totalmente
esta área do conhecimento,esta atitude pensamental,porque ela é tão
importante quanto os outros saberes,pelas razões aludidas.
A História não provou que a contenção da erudição em favor das
atividades concretas e úteis sirva ao progresso desejado.
É um erro do socialismo fazer uma crítica moralizante desta
erudição ,supostamente inútil diante da miséria reinante.É
certo,o socialismo reconhece,que a cultura européia foi absorvida,no
capitalismo dominante,a partir de 1800,pelas classes menos
favorecidas.Nós vemos um Faraday,um Thomas Edison,Fulton,pessoas que
vieram de extrema pobreza e puderam ascender por qualidades de estudo
e esforço.
Isto não prova a tese do liberalismo econômico(não
constitucional)de que é assim mesmo,os mais aptos vencem e quem não
tem capacidade de esforço deve ficar no seu lugar.Mas também prova
que para progredir materialmente e culturalmente tem que haver
liberdade de pensamento e de criatividade.
O ato de substituição da erudição e das ciências sociais pelo
marxismo institucionalizado nos países do socialismo real causou
estragos imensos que vão durar por muitas décadas ainda e aí nós
temos que concluir que o equilibrio entre liberdade e necessidades
sociais deve ser buscado por um novo socialismo.
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