segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Ferreira Gullar



Estas foram duas semanas infernais,desde o passamento de Fidel Castro.Agora a noticia é a morte de Ferreira Gullar,o poeta/político(contra a vontade dele).O que dizer desta grande figura,das artes e da política?
Ferreira Gullar,mal comparando(a favor dele)está nesta categoria de artistas/políticos,como o Lord Byron,como Pier Paolo Pasolini,Percy Shelley,Wagner,Mishima e alguns outros,que não foram artistas alienados de seu tempo e se engajaram em causas,às vezes românticas,às vezes sociais e políticas.
E o momento em que se dá esta consciência em Gullar é o seu rompimento com os concretistas,que eram, na verdade,continuadores do conceito “ arte pela arte”,do século XIX,fazendo uma poesia dissociada do mundo,baseada nos recursos de linguagem que a lingüística no século XX havia oferecido aos literatos de todos os lugares.
A independência da linguagem,não só na poesia,mas também nas artes plásticas, resultou em experimentos formais,nem sempre bem fundamentados.A performance,a participação ativa do público,escamoteavam uma alienação real da arte frente aos problemas da vida e fora da arte parecia não haver mais nada,nem ela  própria,como parte da vida que é!
Sem deixar de se aprofundar nas teorias e sem deixar de reconhecer o papel autônomo,cada vez mais,da linguagem(que o une um pouco a João Cabral de Melo Neto),Gullar teorizou que era possível incluir conteúdos simbólicos,vitais,sociais e políticos(para escândalo dos concretistas) e evitar que jogos de palavras escamoteassem o mundo.
Foi esta “ viragem” que o tornou capaz,apesar de não ser político ,de cumprir um papel de direção responsável nos acontecimentos que antecederam ao 13 de dezembro de 68,o AI-5,que ele poderia evitar.
A sua concepção da vida,que transparecia na poesia,permitiu entender que o confronto com a ditadura era pior.
A sua poesia,por ter conteúdos,não significava um engajamento político direto,mas indiretamente tudo é tocado pelo homem, que trabalha,que ama ,que vive e que sonha com a  utopia.Vê-se isto claramente  em “ Poema Sujo”,em que se fala das cidades,da sujeira,da natureza,mas também do homem,que permeia tudo.Quer dizer ,nunca o poeta sucumbiu aos esquemas fáceis do realismo socialista.Ele continuou um artista de primeira grandeza,na medida em que  sugeria,mais que explicava.Então ele é um dos poucos  que consegue fazer um traço entre o fazer política e a poesia,porque era o poeta do fazer,do criar,do pensar e do sonhar.Tudo isto é engajamento.

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