sábado, 5 de janeiro de 2019

Bolsonnaro é mais Lacerda do que Collor.


Muita gente erradamente está fazendo uma comparação entre Bolsonnaro e Collor,mas quem acompanha a política sabe que a origem do Presidente é diferente.Ele vem mesmo diretamente dos problemas que geraram 64 e pretende recuar no tempo para fazer valer aqueles objetivos.
Do episódio de Herzog até ao Riocentro,passando por Manuel Fiel Filho,a postura resistente da ditadura militar se dá exatamente na suposta necessidade de lutar pelas conquistas do regime militar ou até ampliá-las.
Bosonnaro foi colocado para resistir ao eventual revanchismo da esquerda e como a esquerda não parou de exigir reparações,ele cresceu,como eu já expliquei,no contexto  da polarização e dos erros provocados por ela.
Não voltarei a isto,mas é importante lembrar,porque não só esta conjuntura permanece,como se aprofunda,agora já com a  direita,no poder.
A polarização aumentará na medida em que  uma identificação canhestra da direita com a tradição nacional crista católica,intentará a superação daquilo que ela considera uma ameaça:o comunismo.
Desde a guerra-fria,que começou com  a revolução russa,ambos os lados,direita e esquerda,criam bichos-papão para obter vantagens.Não se trata mais de ter idéias,mas de defender algum projeto salvacionista.Agora é   vez da direita criar o seu para assustar meninos que fazem pipi na cama...
Quando o Presidente se referiu a acabar com o socialismo é exatamente neste contexto  que a afirmação deve ser entendida:não tem significado nenhum o que ele disse,é só uma ameaça.Mas isto não implica em não haver um objetivo real.O que eu quero dizer  é que a expressão socialismo coopta mais pessoas,pela sua generalidade e pelo caráter fanático das pessoas a quem este discurso é endereçado.Mas o objetivo é ,e aí é que eu digo que a semelhança dele é com Lacerda ,se possível,destruir o esquema petista,que,de seu lado,deriva integralmente de Getúlio Vargas.
Vargas criou um sistema de aparente parceria entre a classe industrial burguesa moderna e os operários,que,de fato,mantinha o controle destes últimos.Só que Vargas tinha um projeto nacional/nacionalista,que admitia a ascensão dos operários,através dos sindicatos.Esta tendência era do seu tempo e vinha,também,  do fascismo.Mas ele sabia que a organização sindical ,embora controlada de cima,teria condições,no futuro,de ,por ela própria,formar um governo.
Daí surgiu a  idéia da “ República sindical”,que aterrorizava os setores tradicionais do Brasil em 64 e que baseava os discursos de Lacerda.Esta “ República “ era semelhante ao que se dava na Argentina de Perón e muitos anos depois,a campanha de Margareth Thatcher se viu vitoriosa com o tema da luta contra a  “ditadura dos sindicatos” no reino Unido.Uma linha une estes movimentos de direita e batem agora na nossa pátria tropical.
O PT não é socialista,nem comunista:ele é um seguidor(por falta de proposta e programa)desta estrutura  varguista que ele herdou em 79.Mas ,a partir da era Vargas,e por força do discurso,entre outros ,de Lacerda, a crítica ao sindicalismo passa obrigatoriamente pela crítica ao comunismo,já que o trabalhismo e o comunismo se uniram,não de uma maneira orgânica.
Os militantes do PT associam a  figura de Lula  à de Getúlio e isto é parcialmente verdade,como eu expliquei.No entanto,o que a motiva  é evitar a diluição histórica da figura de Lula,que não foi senão um continuador pálido de uma tradição de esquerda que já devia ter sido sepultada.
Politica de esquerda ,para mim,é aquela que se identifica  com a razão emancipatória:não se trata de eleger um político(qualquer um) para fazer alguma coisa(tirar da cartola)e depois chantagear o eleitor.A estrutura vanguardista da política de esquerda,seja do trabalhismo ou do PT não emancipa o trabalhador,mas o mantém com medidas pontuais de beneficio parcial,sob controle politico-eleitoral.
A minha posição já coloquei aqui inúmeras vezes:não sou contra ir além da Era Vargas,mas este movimento tem que ser a partir dela,não contra ela.
Lacerda ,Witzel(que citou Lacerda na posse) e Bolsonnaro se ligam,pelo liberalismo da economia de mercado a este  escopo destrutivo do sindicalismo,já em curso,com a extinção da justiça do trabalho.
No seu “ depoimento” histórico, Lacerda justificou a sua sanha golpista(que acabou por tragá-lo)alegando que as eleições no Brasil,após a construção do modelo varguista,eram “ viciadas” pela “ máquina do sindicalismo”.Assim ele justificou o golpe contra Getúlio em 1950;assim ele justificou o golpe em 64 contra Jango e assim querem os atuais donos do poder no Brasil justificar a sua predação.
Ao ler artigos como o de Vladimir Safatle sobre a não negociação com Bolsonnaro,fico preocupado que neste embate o problema real do Brasil,a emancipação do cidadão(trabalhador,operário,classe média),seja deixado de lado,em vista de interesses exclusivistas.
A discussão não é entre o esquema varguista-petista ou a economia de mercado,é a emancipação da cidadania,então a pura confrontação só ajudará a direita.A tarefa da esquerda é reforçar as instituições nacionais e garantir(pela negociação)a sua continuidade ,de modo a prosseguir no progresso político do Brasil.Ainda que algumas cláusulas sejam inegociáveis,se a confrontação vier, a direita,como nunca(nem na época de Lacerda)terá condições de desmontar este “ esquema comunista”,mas quem perderá é o Brasil,porque recuará quase ao nível da República Velha.

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