sexta-feira, 8 de outubro de 2021

À propósito da Fundação Palmares de novo

 

                                     continuando o centro é sempre fraquinho

Continuando o artigo anterior esta questão da fundação Palmares oferece uma oportunidade exemplar de explicitar o meu pensamento,que se conecta com as convicções e bases conceituais que eu tenho exposto.

Há muitos anos tive uma dissensão com (ex-)amigos meus da esquerda que aparelhavam a fiocruz.Hoje posso agregar este meu conceito republicano de repudiar a identificação partido/sociedade/estado que grupos de esquerda ,oriundos da tradição do socialismo real,faziam e fazem no Brasil.

Em artigo anterior me referia a isto como característica distintiva do PT,mas que é de grande parte da esquerda,inclusive a que eu pertenci na juventude(embora eu ainda me considere jovem).

A minha trajetória na esquerda desaguou numa concepção social-democrática que era o que predominava no antigo PCI.A verdade é esta.E como o PCI era profundamente crítico à tradição bolchevique ,que juntava o estado ,o partido e a sociedade, a sua prática alternativa e italiana se fundava na luta cotidiana,por meio da sociedade civil e seus agentes.Não era,seguindo Gramsci,o caso de tomar o estado e impor socialismo à sociedade civil,como faz o governo venezuelano,mas de mudar a sociedade de baixo para que ela se expressasse melhor “ em cima”.

Contudo esta luta “ por baixo” não é conspiratória:ela leva em consideração as características do país,da nação e a ordem juridica,respeitando a cidadania,o principio republicano da cidadania.

Ninguém tem o direito de atribuir a todos os comunistas a nemesis stalinista,mas o reconhecimento desta corrente de pensamento obriga-a a respeitar sempre a ordem juridica.

A verdade é que a prática dos comunistas revela que eles sempre seguiram a Lênin na “Doença Infantil”:instrumentalizar a democracia dita burguesa para alcançar o poder.O mesmo fizeram e fazem com o direito:quando lhes serve vale,quando não,não.

Enquanto participantes legítimos da cidadania os comunistas não podem sair dela sem uma boa razão,mas isto não vale só para eles,mas para todo mundo.

Se a esquerda aparelha uma instituição pública ,a direita e qualquer outro grupo têm o mesmo direito.

Lembro-me de quando militava entre os comunistas, que ao receber uma crítica de que o movimento era sedicioso e queria tomar o poder do estado para se impor aos outros,eu respondia:a nossa luta se dava na cultura,nas instituições ,nas mediações do estado e da sociedade e na intersecção entre os dois.

E naquele tempo ficava claro para mim que a postura de esquerda devia ser republicana,ou seja,de não levar o partido e a sua condição politica e pessoal para esta atividade.

Ainda pretendo me extender nas questões da história da luta comunista ,mas agora dou uma palinha ,procurando distinguir a ilegitimidade do uso da força para a implantação do regime, da legitimidade que é consegui-lo pela democracia.

No meu entender a perspectiva leninista de manipular a democracia(e o direito,digo eu)é relativismo,moral e politico, e não tem mais lugar,a não ser se algum cataclismo ocorre(um nazismo tenta se impor por exemplo).Não cabe mais em nossa época, em que o estado ocidental predomina,prescindir do processo democrático.Mesmo naqueles países onde ainda é possível pensar numa revolução de tipo “ oriental” (África)não é desejável, porque as consequencias seriam idênticas às do passado.A primeira antinomia de Gramsci está superada.

Quando Kruschev lançou a coexistência pacifica ainda chancelava a visão de Lênin,porque deixou aos ocidentais a liberdade de fazer socialismo pela democracia,mas prosseguiu apoiando atividades revolucionárias em outros lugares,no que é: relativismo.

Toda a linhagem comunista que aceitou estas verdades buscou uma legitimidade no interior das nações e a obteve.O caso mais elucidativo é o italiano.

Os crimes e violências cometidos pela outra linhagem dos comunistas repercutiu negativamente em outras sociedades(como a brasileira)que os repudiaram definitivamente.

Num país como a Itália ,fortemente católico e cujo catolicismo apoiara fortemente o fascismo e Mussolini,era de se esperar que a ascensão pós segunda guerra dos comunistas fosse rejeitada sobejamente por esta média ética e no inicio foi assim.Mas logo o diálogo cristão-comunista se aprofundou e as atitudes de respeito permanente à democracia dadas pelo PCI cimentaram a confiança do povo italiano nos comunistas.

Sempre é bom lembrar que,na década de 50,quando a miséria causada pela guerra ainda campeava,os militantes quiseram passar por cima da direção e de Togliatti e tomar o poder de estado ,mas a liderança negou,afirmando que era uma precipitação que poria abaixo tudo o que o PC havia conquistado até então.Togliatti chegou a ser baleado e o seu ofensor,depois,passou a ser seu amigo,quando Togliatti,no hospítal,lhe explicou o que estava de fato acontecendo.

Nos dias de hoje,só é possível,no meu entender,adquirir legitimidade e confiança se esta atitude republicana for permanente.Só assim ,mostrando que a esquerda(não vale só para os comunistas)não quer melhorar o mundo sozinha e não respeitando a média ética,os valores e as instituições de determinado lugar,é que poderá ser efetiva novamente e não causar esta bagunça que o país enfrenta.

Tenho noticias e conhecimento de que na Fundação Palmares havia um aparelhamento e se é assim não há diferença entre o dela e o da esquerda,me desculpem os companheiros.

Num país como o Brasil nós vemos midias apoiarem candidatos e partidos,bem como sindicatos.A única diferença para o socialismo real e que lá era um grupo só,aqui vários,que vendem a ideia de que isto é democracia.



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