Em
seu “Espirito das Leis” Montesquieu,para
fundamentar a sua teoria da representação,faz uma distinção entre o
comportamento do burguês e do aristocrata.A sua perspectiva era comum na sua
época,se refletindo também na postura estética de um Moliére,por exemplo.
Para
Monstesquieu o burguês extrai do dinheiro que guarda a sua identidade.Ele só é
o que é porque tem dinheiro.Diferentemente o aristocrata é movido pelo
sentimento de honra,que,segunde ele,é um valor transcendente e que reside na natureza
humana,para além das questões práticas e comezinhas que permeiam a vida
burguesa.Quer dizer a nobre arte da vida e da política(bem como da liberdade)só
podia ser exercida pela aristocracia,pelos melhores,pelos mais capazes de ir
além dos interesses e se ocupar da polis.Só a aristocracia tinha(por
escolha[segundo ele])ligação com a polis e a liberdade,entendidas como o corpo
político,a coletividade humana,tocada pelo estado e pela administração pública.O
burguês só pensa em si mesmo.Não ocorreu
a Montesquieu que o aristocrata tinha liberdade porque alguém trabalhava por
ele...mas isto é outro assunto.
Para
além do problema de classes,que deslegitima o aristocrata,pelo útlimo motivo
supradito,o direito de escolher o seu caminho garantido a ele pelas
circunstâncias sociais,não impede que o senso de honra seja um valor atribuível
a qualquer pessoa,inclusive do povo,o plebeu.O plebeu,digo eu,é despojado,vive
do seu trabalho e isto encerra uma certa honorabilidade,mas uma honorabilidade
dependente de certos comportamentos.Na aristocracia predomina a escolha,a
escolha livre de condicionamentos.
Os
comunistas,os marxistas,tão críticos com Montesquieu(com uma certa razão)sempre
usaram parte de seus argumentos opondo a figura heróica de Napoleão ao
oportunismo da burguesia,representada,em 1815,após a Batalha de Waterloo,na
figura do banqueiro judeu Rotschild.Com a derrota de Napoleão o banqueiro jogou
na bolsa e ganhou fortunas.
Tradições
de comunistas sempre defenderam uma postura heroica do movimento,do trabalhador
diante do burguês,numa associação bastante imprevista com a aristocracia.Até acrescentam
,pelo compromisso do trabalho,algo mais ao sentimento de honra.
Esta
é uma das razões pelas quais Moliére,tão inserido no seu contexto
histórico,continua atual:a atitude aristocrática,para além da classe,é o sonho
da humanidade.A elegância própria e
exigível da aristocracia é derivação inevitável da escolha por si mesmo,do
sentimento de valor da pessoa consciente,capaz de escolher sem nenhum
óbice,nenhuma barreira.
No
entanto,em nossa época,em que a utopia de modo geral foi questionada(no
mínimo)sobrevivendo as necessidades humanas,a burguesia mantém sua hegemonia,contra
tudo e contra todos.
Diante
deste fato deveria haver um desespero,pois a condição humana,supostamente,não
existiria mas e aquele mendigo que chama a todos,por aí, de inumanos teria
razão.
Mas,lembrando
as concepções de Paul Ricoeur,dos neo-aristotélicos e dos próprios gregos,a constatação
dos fados,do inevitável na vida(como se colocou diante de Édipo),é uma
oportunidade de superação,que todo limite(aparentemente )intransponível
proporciona.É justamente porque,como diz Freud,o ser humano não se adequa,que o
fado,embora real,não limita a sua subjetividade,que é algo maior do que aquilo
que se impõe a ele.É justamente a constatação essencial do limite que propicia
os projetos.Os totalitarismos,de esquerda ou de direita,as psicopatias,não
compreendem que o fado não é o inferno,mas a condição de possibilidade.As
crises também o são,mas no sentido de que o acaso oferece a oportunidade.Mas o
fado não é diferente.
A
derrota para a Bélgica,mais uma em nível universal de Neymar,é um fado
irreversível(como todos os fados),mas não paralisa o tempo.A oportunidade
continua,se esta constação,fado-tempo-possibilidade,for identificada.
A
subjetividade não encontra nas coisas,nos atos,a sua realização,pois só se
realiza aquilo que já está na cabeça do homem,compreendido e sentido emocionalmente.Como
na aristocracia a relação de si para consigo mesmo é a chave para solucionar os
problemas e os impasses que uma derrota cria.
Não
é o trabalho,o dinheiro ou o despojamento que dignificam o homem,mas ele mesmo
com as suas escolhas.Antes e acima destas mediações está a pessoa.
Estes
jogadores do Brasil ,e Neymar entre eles,bem como os outros,pelo mundo
afora,nos seus próprios países,ganham caminhões de dinheiro,legitimamente,mas parecem se reduzir a
eles(aos caminhões e ao dinheiro).Eles se tornaram piores que os investidores
do mercado financeiro,porque estes ainda aparentam um certo propósito.Mas os
jogadores de futebol se tornaram parte da engrenagem financeiro-política em que
se tornou o esporte.
Não
há mais necessidade de fazer história(com mais legitimidade do que Napoleão);não
há mais desejo de uma grande jogada a ser lembrada séculos afora,por
gerações(como as de Pelé em 70).A questão é garantir a sobrevivência sem
trabalho( e realizações)dos descendentes.Um
jovem que ganha desde antes dos vinte anos 100 mil reais não necessita
mais de construir um nome e de deixar uma mensagem.Nós somos os
anti-gregos:nenhuma preocupação direta com a polis,com os outros,com o povo,com
a liberdade ,com as realizações(as obras),com a eternidade,só ganhar dinheiro e
aproveitar não sei o quê.A escolha(e a
liberdade)é substituída pelo dinheiro,pelo caminhão de dinheiro.
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