Começar de novo
Aos 23 anos eu
estava esperançoso no comicio da diretas.O meu fervor era pela
democracia,que renascia a olhos vistos depois de anos repressivos e
perigosos.
A minha felicidade
era imensa ,exceto por um fato: a falta do PT no palanque,uma atitude
que eu considerei na época infantil(doença infantil),mas
que,agora,à luz da maturidade,considero tudo,menos uma criancice.
Para mim ,até
hoje,isto foi mais do que um exclusivismo do PT,mas um descompromisso
permanente com a democracia.Dom Quixote,numa das suas primeiras
aventuras libertou pequenos meliantes enjaulados.Sen refletir na
culpa deles, o sonhador revelou sua admiração sem travas pela
liberdade,acima da justiça dos homens.
O PT revelou a sua
desconfiança(bem como de outros setores de esquerda),para dizer o
mínimo,em relação à democracia ,como irmã gêmea que é,da
liberdade.
O que significou
historicamente e realmente,o PT?
O PT(como o
Solidariedade na Polônia)surgiu das lutas operárias em meio à
dissolução da(-s) ditadura(-s).
Como pacifista e
reformista(reformista revolucionário) que sou, detesto associar
mudanças positivas com violência e brutalidade.A primeira vez que
fiz esta reflexão foi analisando o periodo da reforma protestante,um
dos meus assuntos preferidos e recorrentes.
A
Reforma,desencadeada por Lutero desencadeou igualmente muita
violência,com as guerras camponesas da Alemanha,com revoltas
subsequentes,mais divisões neste país e um assomo de
autoritarismo.Teria sido melhor que a reforma da igreja católica
tivesse sido uma auto-reforma, que era o que desejava Erasmo de
Roterdam,um pacifista capaz de talvez convencer a hierarquia
tradicional da igreja.
Erasmo e Lutero
chegaram a marcar um encontro,que não se realizou
lamentavelmente.Lutero disse que “ Deus evitou que este herético
caísse no meu redil”.
Mas foi uma
oportunidade perdida a meu ver,de fazer uma transição(e
transação)pacifica do mundo medieval para o moderno,sem
cataclismos,que é uma das virtudes das transições,como se viu na
passagem das ditaduras militares em muitos lugares(não só na
América Latina,mas na Grécia também por exemplo)para as
democracias.
O PT não participou
desta transição.Se eu qusiesse podia ironicamente relacionar o PT
com as ditaduras,mas eu não farei isto.Muito embora eu tenha dúvidas
sobre a história do PT e de Lula no que tange aos seus inicios,não
farei isto.Existe um zum-zum-zum quanto ao apoiamento de Golbery ao
recém-criado PT,para pulverizar a oposição em múltiplos partidos
e favorecer a hegemonia da ditadura no tempo da abertura.Mas isto
ainda é controverso.
O fato é que o PT
não participou da transição e isto me magoou profundamente in
illo tempore .Com
o tempo esta mágoa não só cresceu,mas se tornou constante
desconfiança,com a postura do PT na constituinte e a mudança no
final dos anos noventa ,motivada pelo desejo irrefreável de ganhar
as eleições presidenciais.O Partido da honestidade,o partido puro
abriu mão disto para jogar as regras do jogo “
democrático”(burguês) fazendo uso de caixa 2 ,campanhas
milionárias,todos os criticados truques burgueses,anti-operários.
O
PT nasceu não ligado umbilicalmente ao comunismo passadiço,que
viveu nas décadas de 70 e 80 a sua decadência final,iniciada em
68.Nunca foi um partido leninista,de centralismo “
democrático”,mas como calcado estritamente num clássico
operariado industrial contém desde os seus albores práticas e
conceitos muito aproximados com o citado movimento comunista.
Alguns
autores o definem como um herdeiro do antigo PCI,mas eu entendo que
isto só é válido na relação do PT com o cristianismo,com a
militância de esquerda (teologia da libertação)católica.Conceitos
provindos do comunismo italiano,como consenso majoritário,visão
nacional(inclusão da classe
média[Gramsci{nacional/popular}),alternância de poder,não estão
presentes no partido,exceto em alguns grupos,que ,às vezes
reverberam na cúpula.
Aliás
estes grupos acrescentaram a estas práticas operárias referidas
estes valores mal digeridos e misturados com um pragmatismo,que
constituem as características altamente duvidosas e criticáveis
deste partido.
Assim
como falei na auto-reforma da Igreja,acima,o PT expressa o mesmo
problema histórico,ou semelhante,mutatis
mutandi ,da
passagem secular entre o mundo medieval e o moderno:o peso do
passado,exigindo solução imediata, “ escolheu” o radicalismo de
Lutero em detrimento dos cuidados do humanista Erasmo.
Em
função das demandas reprimidas do movimento operário na década de
70,imprensada pelo arrocho salarial,fazendo desta classe o bode
expiatório financeiro do futuramente desmentido “ milagre
brasileiro”,ela se jogou no proscênio da politica,a partir de sua
agenda concreta de reinvindicações salariais.Isto já foi um
complicador,porque a politica e a abertura entraram como meio de
solucionar estas questões concretas ,não havendo um programa prévio
a dirigir as ações.Era um sindicalismo que se encorpava em meio às
lutas se fazendo meio que às cambulhadas.
Percebendo
esta situação e a decadência do movimento comunista,os antigos
militantes,até para se preservar deste fim d e festa,se dependuraram
neste movimento nascente para sobreviver e para sonhar com um
revivescimento do comunismo, a partir da classe principal,deixando de
lado toda a auto-reforma feita nos anos anteriores.
Como
Lutero/Erasmo,o comunismo/PT expressou a predominância das
exigências imediatas sobre o esforço de compreensão dos erros e
sua superação cuidadosa ,democrática,a garantir,quiçá,um futuro
mais firme e seguro.E esta influência dos antigos militantes fez e
faz do PT um partido hibrido,transicional:meio a se fazer e meio
preso a um passado ,digamos ,radical de esquerda(para não dizer
comunista).E como diz Gramsci ,enquanto o mundo velho não se vai e o
novo não aparece vive-se numa situação d e morbidez ,de
violência,incerteza,males que hoje se tornaram moeda corrente no
Brasil.
Lula
o egoísta,Dilma a sua herdeira
Este
exclusivismo do PT,exclusivismo de classe obreira(outra herança do
passado)se vê hoje num outro item que deve ser acrescentado:o
personalismo.O antigo personalismo(stalinista?populista?)se
cristaliza no Lula de sempre e de hoje quando põe os seus interesses
pessoais em identidade(forçada)com os interesses partidários e
nacionais(totalitarismo).O ataque à Moro,a luta por vingança não é
uma questão pessoal,mas da democracia.Se ele for vitorioso a
democracia será.
O
presidente tem o direito e até o dever de lutar por sua carreira e
vida pessoal,tudo bem.Mas esta luta não é identificada,como a de
nenhum politico,com as carências nacionais.Isto é um assomo de
delirio totalitário típico do stalinismo e mais de Chavez e Maduro
e marca uma continuidade dramática(porque já devia ter sido
superado)com o populismo brasileiro,o que configura um atraso na
vanguarda do movimento operário,uma tragédia para o Brasil(se a
vanguarda é assim o que se dirá do resto).
Será
que o PT e Lula não vêem a jogada da direita?Colocar os militares
no poder e os evangélicos na mídia ,no mainstream?Que bater em Moro
e na Rede Globo ajuda a este projeto?Se a Globo acabar(que é o que
Bolsonaro quer)onde o movimento LGBTQI vai arranjar emprego?Na Tv
record?
A
politica não são só as pessoas,a vontade da vanguarda não,é o
movimento cotidiano,como Tancredo e o movimento de auto-reforma do
comunismo,ensinaram.
Dilma,herdeira
de Lula,entrou no PT dentro daquilo que eu citei acima,a guarida dos
grupos sem rumo do radicalismo de esquerda,que se dependuram num
grande hospedeiro,para sobreviver a qualquer custo,sem ideias novas e
tentando provar que o que fizeram no passado ainda vale.
Dilma
participou do vaguardismo comunista que se jogou irresponsavelmente
na luta armada.O desejo irrfreável de continuísmo do PT e de Lula
fê-la ,com pouca experiência politica,um joguete igualmente
irresponsável no processo democrático e foi o que se viu.
Não
sou contra a reparação dos crimes da ditadura.Assinei as listas
para defender este direito das famílias,mas é preciso,como eu já
expus em outros artigos,não misturar esta problemática do passado
com o Brasil,com os problemas do Brasil.
O
problema da tortura não é um problema da esquerda,mas do
Brasil,como formação histórica.Fazer esta identificação é
desinformar o povo e vender a falsa ideia de que só a assunção dos
comunistas ao poder o resolve,quando tal é tarefa da cidadania,como
um todo,inclusive da classe média.
Sofro
muito com o receio de que esta incompreensão,que só reforça a
confrontação direita e esquerda que vemos hoje,leve o Brasil a uma
guerra civil(não agora ,mas no futuro),que para muitos radicais é a
condição de mudança no Brasil.Necas!
Digo
eu.Não se trata de colocar um governo de maioria no poder,mas de
congregar o maior numero de setores sociais para compreender as
questões de fundamento da nação e mudar.Não é dificil tomar o
poder.Lênin mostrou que com minorias é possível mudar o mundo,mas
não para melhor.O mais importante é o que vem depois da tomada do
poder e saber o que fazer se constrói bem antes(no
cotidiano,sempre).
Temo
que não havendo reparação aos crimes da ditadura a
esquerda,representada aqui por Dilma,insista neste caminho ad
infinitum o
que seria uma tragédia.
Num
artigo de muitos anos atrás delimitei que se os comunistas
reccorriam ao direito para defender os seus de cidadania não terão
nunca mais o direito de ofender a norma,num propósito
revolucionário.Não poderão “ virar a mesa” como eu ouvi
milhares de vezes na minha militância de jovem.
Se
não houver reparação a justificativa desta “ virada” estará
dada.Tratarei deste problema em próximo artigo.
Apostolos
Pedro e Paulo da democracia brasileira nos(me)ajudem daí de cima.
Em
função destas prévias reflexões ,que dão continuidade ao “
virar as costas” à transição em 85,é que posso afirmar que a
transição não acabou.Neste caso não há que s e culpar só o PT.A
morte de Tancredo pôs no poder o último chefe parlamentar da
ditadura.Muita gente diz que isto foi um complicador ,mas na verdade
facilitou as coisas para o regime anterior:seria muito dificil para
Tancredo ignorar as reparações como lider civil e democrático que
era e Sarney,politico profissional,soube entender esta realidade e
jogou tudo na economia,nas ameças da economia,unindo o Brasil em
torno de uma plataforma monistica,o que mandou para debaixo do tapete
as questões morais.Sarney propôs um item de programa
nacional,coisa que o PT nunca soube fazer,não faz e tem raiva de
quem sabe.
Tancredo
era como Sanguinetti no Uruguai:os militares o cercaram.A Argentina
foi um outro caso ,porque a ditadura se desmilinguiu na guerra das
malvinas e teve que pedir ajuda à esquerda ,que comandou a
transição e entrou na nova fase dando as cartas.Outro assunto.
Até
Lula e seus dois governos,um de esperança e outro de
debacle,imaginava-se prosseguir com o Brasil somente,mas com Dilma se
retomou a reinvindicação não reconhecida pelo governo Sarney e
tratada parcimoniosamente por Fernando Henrique e pelo próprio
Lula(e um pouco Itamar)e ,entre outros erros,desandou.
Então
estamos naquele periodo de 85 e temos que recomeçar daí,propondo
uma solução definitiva para o ter e o haver da ditadura e do novo
regime ,se quisermos,como eu quero,sair da guerra-fria,de 64 e
entramos no século XX e no Brasil.Abordarei isto em próximo artigo
e explicarei a uns beócios das redes o meu entendimento do que é
nacional.
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