Existem
movimentos no Brasil que confundem
laicismo com ateísmo. A URSS ,desde as constituições patrocinadas por
Lênin,afirmaram o ateísmo como política de Estado,defendendo o seu proselitismo.
Dentro de uma
tradição que remontava ao século XVIII(talvez até antes,séc. XVII),como
resposta às guerras religiosas,a luta pela tolerância foi construindo um
pensamento ,que desembocou no republicanismo moderno,de que a religião não
devia se misturar com a política. É um aprofundamento de concepções que vêm de
um Erasmo de Roterdam,por exemplo,que acusava os Papas de não serem pastores,como mandava a
Bíblia e Cristo. A precipitação da Reforma e a consequente
Contra-Reforma,rivalidade que gerou as terríveis guerras religiosas,colocou
para debaixo do tapete estas concepções.
Depois do século
XVIII,o problema judaico ,na Europa,trouxe de volta o problema religioso.
Muitos judeus (como o pai de Marx,por exemplo),na Alemanha ,se aculturavam
alegando uma atitude agnóstica diante da religião. Que a questão da crença em
Deus era uma questão pessoal e que o problema era a religião,uma questão de
poder como qualquer outra e em nome desta aculturação afirmavam que o Estado
Moderno não devia se imiscuir na religião,porque assim,embora estes judeus se
aculturassem,não ficavam mal com seus irmãos,que resistiam.
O deísmo,na
Europa,de um Voltaire ou de um Robespierre,era uma forma de amplificar o
direito inerente de cada cidadão,principalmente nas cidades Européias
protestantes,pós-guerras,de manter as suas crenças como algo estritamente
privado.
O direito
protestante de ler a bíblia e interpretá-la com mais liberdade colocou a
possibilidade ,para alguns corajosos,de não interpretá-la,de deixá-la de
lado,bem como a Deus.
Vê-se por aí que
a separação entre igreja e Estado,como representante dos cidadãos e o ateísmo
estão juntos. Contudo ,dentro da liberdade civil não estão.
Na Revolução
Francesa a afirmação do estado laico é absoluta,depois de 1792,com a primeira
república francesa. Contudo os excessos e libertinagem política e social geral forçaram Robespierre a criar um símbolo
deísta,que transcendendo às pessoas,lhe desse propósito e motivo de obediência
e disciplina do cidadão. Este símbolo foi o culto do ente Supremo ,que poria os
cidadãos numa humilde constatação de que há algo maior do que ele. Robespierre
ainda era um homem do passado,porque o cidadão ,no sentido moderno da
expressão,não deve respeito a um Deus medroso de aparecer,mas à lei,ao
Estado,se este o representar de fato. A lei é que era fraca,não Deus.
Dentro deste
cadinho,estas ideias,laicização e ateísmo adquiriram contornos precisos.
Elas,lógico,se relacionam,mas laicização é um processo coletivo e social
amplo,pelo qual o homem,dentro daquilo que Horkheimer chamou de “
desencantamento do mudo”,percebe que pode dominar a natureza,sem medo de atingir entidades
supostamente perigosas e transformara a
si mesmo,sem a religião. O ateísmo deriva de atitudes individuais,com as
famosas,de D´Alembert e Laplace. Tanto um como outro elaboraram sistemas
matemáticos do mundo. Quando Laplace apresentou o seu projeto para
D´Alembert,este teria perguntado:” Onde está Deus no seu sistema?”,ao que
Laplace teria respondido:” Não tenho necessidade de Deus para construí-lo”.Quando
um soldado fez uma afirmação semelhante diante de Napoleão ele teve reação
idêntica. O soldado,depois de uma manobra bem-sucedida teria dito” Graças a
Deus conseguimos !” ao que Napoleão teria afirmado “Deus não tem nada a ver com
isso!”,como a dizer “ fui eu!”.
Esta atitude
muito escandalosa para a época,começou com a ciência moderna ,que a custo teve
que admitir que o Deus dos cristãos estava abalado. Apareceram os arranjos
filosóficos para mantê-lo,como é o caso do Deus que dá um “ peteleco”na máquina
do mundo ,mas não intervém. Ou mesmo as tentativas de religiosos sofridos como
Pascal,com o seu “ Deus absconso”,” escondido”.E com a famosa aposta:” Creio em
Deus fazendo uma aposta,porque se ele não existir eu não serei punido;e se ele
existir não terá motivo para fazê-lo”.Apesar de tudo esta concepção abala a fé
dos religiosos e das religiões.
De tudo resulta
que a separação entre a igreja e o estado é cada vez maior e que dentro deste
processo o ateísmo se afirma. Contudo,a laicização é um prolema geral e o
ateísmo uma atitude individual. O ateísmo é assim chamado como um movimento
geral na História,mas não há como ser um movimento político ou cultural porque
ele reside no nada,na não-crença,em algo inexistente,logo,ex-nihilo nihil. O
ateísmo só é importante de se colocar
enquanto medida do proselitismo da sociedade. Quer dizer ,o direito de ser ateu
impõe à religião uma atitude plural que ela admitiu muito a contragosto a
partir da década de sessenta do século passado,acabando com as vocações
impostas. Mas substituir o proselitismo da Igreja pelo do Estado,como fez o
stalinismo, é incorrer no mesmo erro,fazendo do ateísmo uma religião ,o que é
um absurdo.
O meio de lutar
contra a intolerância é fazer do estado um apoiador de todos e mostrar aos
cidadãos que eles podem e devem levar os seus valores religiosos,mas que,na
vida social e política,o que relevam são os problemas práticos e não
ideológicos.
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